Sozinho mas feliz!

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Sozinho mas feliz!
Derrubando o pesado estigma social do isolamento, cada vez mais pessoas da terceira idade têm mostrado, na prática, que é possível viver sozinho e bem, compartilhando a vida com amigos e familiares, mas sem a carga da dependência

 Christiane Brito


Com o aumento da qualidade de vida é inegável que a população brasileira está vivendo mais e, felizmente, melhor. O que significa também dizer que cresceu muito nos últimos anos o número de pessoas na terceira idade que estão optando por morar sozinhos e criar seus próprios mecanismos para driblar a solidão e encontrar formas saudáveis de ocupar o tempo, mesmo que o cuidado com os filhos e o trabalho fora de casa já não façam mais parte da rotina diária.
 

E mais uma vez felizmente os estudos nesta direção mostram que a idéia que se tem de que o idoso que mora sozinho é fatalmente uma pessoa infeliz solitária e isolada está caindo por terra.

Opção pela independência

Preservar a independência e não se sentir incomodando filhos, noras, netos e outros parentes têm sido os dois pilares desse novo comportamento de grande parte dos que chegam à terceira idade com saúde e vitalidade e, por isso, cada vez mais independentes e autoconfiantes. Esta é a conclusão revelada no estudo realizado pelo Centro de Estudos do Envelhecimento da Unifesp, dentro do projeto Epidoso, que analisou o comportamento de um grupo de idosos moradores da Vila Clementino, um bairro de classe média de São Paulo. Para a pesquisadora Sônia Geib, que atuou no projeto há nessa população, que chega a uma idade avançada, uma grande necessidade de preservar a independência, mas também ter a certeza de que não estará sendo um incômodo para outras pessoas. No final, isso gera uma força extra que faz com que este idoso reencontre mecanismos para se manter sozinho, estimulando sua capacidade funcional e produtiva. O que é um ponto extremamente positivo para qualquer pessoa, em qualquer situação ou idade.

A importância de contar com a família

Um outro estudo da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, em parceria com a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) revelou que aproximadamente 13% dos idosos da capital paulista hoje moram sozinhos. O preocupante, no entanto, é que esta pesquisa mostrou também que a grande maioria sequer recebe qualquer apoio ou ajuda de seus familiares e, com isso, muitos deles se sentem abandonados e, portanto, sofrem com o isolamento nada voluntário. Com isso, o estudo também evidenciou que o problema na terceira idade não está em morar sozinho e sim no fato do idoso se sentir esquecido por seus parentes.

Confirmando essa idéia, a psicóloga e Mestre em Gerontologia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Valéria Bellini Lasca garante que o “idoso pode muito bem morar sozinho, mas ele só não se sente solitário se sabe que tem alguém com quem realmente contar”. Segundo ela, mesmo que os familiares sejam muito ocupados e tenham pouco tempo para este idoso, se houver a certeza de que em uma necessidade haverá o socorro imediato, o sentimento de isolamento e abandono não persiste, garantindo assim a possibilidade de uma vida sozinha satisfatória e feliz. Isto porque a psicóloga garante que para o idoso a sua maior valorização está na família, por ter sido em torno dela que dedicou a maior parte de sua vida até então.

Ociosidade pode deprimir

Os vários anos de acompanhamento destes idosos ensinaram também que é de extrema importância que o idoso se mantenha longe da ociosidade, muito comum quando ele vive na casa de parentes onde não tem mais as suas funções diárias. A cabeça ocupada e o corpo em atividade são fundamentais para preservar a saúde física e emocional da pessoa na terceira idade, mesmo que já não precise lutar pela sobrevivência. E os especialistas recomendam ainda que o idoso busque incorporar à sua rotina atividades que lhe dêem prazer ao realizá-la, que combinem com seu jeito de ser e lhe tragam alegria.

As três raízes da solidão na terceira idade
Para a geriatra Louise Montessanti, do Centro de Saúde Escola da Barra Funda da Santa Casa e, da Unidade de Referência de Saúde do Idoso da Lapa, São Paulo, as causas da solidão na terceira idade podem ter origem em três grandes problemas:
• Saúde precária – A geriatra observa que muitas vezes o idoso tem problemas sérios de saúde como incontinência urinária ou perda grave da audição, entre outros limitadores e não recebem o tratamento adequado, porque na maioria dos casos, nem chegam a procurar um especialista para identificar as causas do problema e, com isso, “o idoso fica com vergonha de se relacionar”, garante Louise, dando como exemplo situações corriqueiras como aqueles casos em que o idoso não ouve direito. “Ele até pode ter vontade de conversar, mas se chateia e perde essa vontade quando percebe que a outra pessoa tem que gritar para que ele ouça”, diz.
• Preconceito contra a própria idade – Louise Montessanti chama atenção para o fato de que muitas pessoas não estão preparadas para envelhecer e acabam tendo preconceitos contra elas mesmas. Ela explica que, principalmente os homens, não se preocupam com a terceira idade e quando se deparam com ela têm dificuldades para aceitá-la. “Não querem, por exemplo, ir a um baile de terceira idade e acham chatos os assuntos das pessoas”. Uma saída dessa armadilha é, segundo a geriatra, estar sempre em atividade, procurando algo que dê prazer e que se encaixe com seu jeito de ser. “Por exemplo, um homem que trabalhou a vida inteira na roça, é analfabeto, não vai se dar bem numa universidade para a terceira idade. Ele se sentiria bem melhor participando de um projeto de horta comunitária talvez. Já um senhor intelectual não ia se achar num baile, mas talvez gostasse muito mais das aulas de uma faculdade”, sugere.
• Exclusão social – A especialista também aponta uma causa social para a solidão e isolamento na terceira idade. Segundo ela, diferente da criança, o idoso é menos atraente ao trabalho voluntário: as pessoas preferem se dedicar a orfanatos do que a asilos. Com menos programas voltados para atender suas necessidades, muitos idosos acabam se isolando por pura falta de atividade no meio onde vive.
Neste caso, o papel da família ou de quem está mais próximo é fundamental para incentivar este idoso a procurar uma atividade que lhe faça bem..
 
 
Viva mais e melhor
A longevidade já é uma realidade e é preciso aproveitá-la ao máximo. Por isso, é bom ficar de olhos bem abertos para alguns detalhes que podem ajudá-lo a tornar sua vida mais plena, saudável e, principalmente prazerosa. Afinal de contas quem chegou a terceira idade merece aproveitá-la intensamente.

• Cuide da saúde com atenção, investindo ao máximo na medicina preventiva e mantenha suas consultas sempre em dia.
• Fuja do desânimo e do sedentarismo buscando sempre estar em atividade, de preferência produtiva e prazerosa.
 
• Não descuide de seus relacionamentos familiares, sociais e, de preferência ame muito, porque faz muito bem à saúde.
• Encare a situação de morar sozinho como uma conquista de independência e autonomia.
• Peça ajuda sempre que sentir necessidade. Afinal, as pessoas estão aí mesmo para ajudar umas as outras.
• Morar sozinho não é sinônimo de viver sozinho, por isso, se isolar, jamais! É fundamental estar sempre atento a novas oportunidades e para isso é preciso se relacionar.
 

Fontes:
Sônia Greib – Geriatra e pesquisadora do Centro de Estudos do Envelhecimento da Unifesp
Luiz Roberto Ramos – Diretor do Centro de Estudos do Envelhecimetno da Unifesp
Louise Montessanti – Geriatra do Centro de Saúde Escola da Barra Funda da Santa Casa e, da Unidade de Referência de Saúde do Idoso da Lapa
Valéria Bellini Lasca – Mestre em Gerontologia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)