O DESENHO UNIVERSAL COMO PARTIDO ARQUITETÔNICO

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O DESENHO UNIVERSAL

 COMO PARTIDO ARQUITETÔNICO

  Marjorie M. Naddeo

Para a maioria das pessoas maduras, a felicidade é feita de coisas simples, como conviver com outras pessoas no dia-a-dia e manter certos costumes. Um desses costumes é o de permanecer em suas próprias casas à medida que envelhecem, o que nem sempre é possível, pois subir uma escada, tomar banho sozinho e cozinhar passam a ser tarefas complicadas à medida que o corpo envelhece. As tarefas diárias passam a ser um obstáculo. Por esse motivo, acabam mudando de suas casas, o que pode ser uma experiência traumática, já que a residência passa não ser tão segura e confortável.


Além disto,hoje em dia, existem muitos, adultos e crianças com inúmeras dificuldades físicas, não fazendo parte do padrão estabelecido para os parâmetros de objetos e construções.
O número de pessoas com limitações físicas é de aproximadamente sete milhões. Fazem parte desse número não só pessoas portadoras de deficiência física, mas também homens e mulheres com mais de 60 anos ativos, sem contar os deficientes temporários (pessoas que sofreram acidentes ou fizeram cirurgia, mulheres grávidas), além de obesos, crianças e seu transporte. Em virtude disso, essas pessoas têm dificuldades de realizar suas atividades num mundo cheio de barreiras.
A maioria dos ambientes construídos apresenta barreiras visíveis e invisíveis. As visíveis são impedimentos concretos como a falta de acessibilidade dos espaços. Já as invisíveis são a forma como essas pessoas são vistas pela sociedade, que em geral, repara em suas limitações e não em suas potencialidades. Se as barreiras visíveis forem diminuídas ou até extintas, as invisíveis consequentemente sumirão.
Os ramos de construção e design têm feito produtos especiais, porém são produtos caros e acessíveis a uma pequena parcela da população. Adotando-se o desenho universal como conceito, produtos e construções servirão para todos.
 Assim, os arquitetos devem conceber os espaços pensando também nessa população (que ainda continua excluída em grande parte, refém do preconceito e até de sua moradia) cada vez mais crescente, para que possa haver conforto e segurança.
O projeto que for concebido com os princípios do desenho universal, além de poder ser desfrutado por uma parcela bem maior da população, sofrerá pequenos acréscimos (cerca de 1%) sobre o valor da obra, mas se precisar ser adequado depois de construído, esse valor poderá ser igual ou maior que 25% para o morador.
 Além disso, os edifícios acessíveis serão mais econômicos, já que evitarão acidentes devidos a projetos inadequados, acarretando gastos com hospital, por exemplo.
CONCEITO
Na década de 60 falava-se em desenho livre de barreiras.  Mais do que removê-las a ideologia pregava o cuidado para que elas não viessem a existir. A evolução deste conceito originou o desenho universal, ou seja, conforto e acesso ao alcance de todos, sem preconceitos e considerando a diversidade humana.
O conceito do Desenho Universal significa projetar espaços de forma a atender simultaneamente a todas as pessoas com diferentes características antropométricas e sensoriais, de crianças a idosos, incluindo aquelas que possuem alguma limitação física (permanente ou temporária) de forma autônoma, segura e confortável. Esse conceito parte do princípio que uma cidade deve ser acessível a qualquer pessoa, desde seu nascimento até sua velhice.
É muito importante para as pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida a existência de condições que permitam o livre acesso com segurança e autonomia aos espaços e edificações públicas e privadas.
A garantia do direito de ir e vir destas pessoas depende obrigatoriamente das perfeitas condições de acessibilidade destes espaços, que irão permitir o acesso ao estudo, trabalho e lazer, integrando-as à sociedade. Estas condições estão previstas na Lei Federal 10.098 de 19 de dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida.
Esta lei determina que os parâmetros a serem seguidos sejam os da NBR 9050 (acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos) da Associação Brasileira de Normas Técnicas. Apesar da existência da lei e da norma, o que vemos nas cidades ainda não atende plenamente o direito de ir e vir do cidadão portador de deficiência ou com mobilidade reduzida, pois os espaços ainda têm sido projetados para um tipo físico “médio” – sexo masculino, jovem, adulto e saudável. Mas o fato é que apenas uma parte da população atende a estes requisitos. As pessoas são diferentes em suas necessidades físicas e isso deve ser considerado no projeto.
Se considerarmos cada etapa da nossa vida, em algum momento dela todos nós experimentamos algum tipo de dificuldade na utilização de um produto ou no acesso a algum ambiente. Por exemplo, uma criança não consegue alcançar o botão do elevador e um idoso pode ter dificuldade em subir uma escada se não tiver corrimão. O design inclusivo visa minimizar estas dificuldades concebendo produtos, serviços ou ambientes que atendam a todos. Segundo o professor Guimarães, da Universidade Federal de Minas Gerais, “todos nós somos portadores de deficiência ao lidarmos com situações e espaços que não se ajustam às nossas habilidades, mesmo que circunstanciais, como carregar uma criança no colo ao subirmos num ônibus ou carregar sacolas escada acima depois de chegar do supermercado com o carro lotado”.
 Assim, a residência ideal e segura é aquela que segue os conceitos do desenho universal, contendo características de habitabilidade e funcionalidade, permitindo aos moradores segurança, independência e conforto. Essas características são tão simples, que passam despercebidas, como uma casa comum. A diferença é que elas são funcionais para todos, saindo daquele estigma de ser especial.
O DESENHO UNIVERSAL NO MUNDO
Em diversas partes do mundo o conceito do Desenho Universal já é aplicado em inúmeros empreendimentos, para atender o envelhecimento da população e a busca de moradias que possam ser utilizadas por toda a vida.
No Japão há dois conceitos utilizados: Ageing in Place,  onde  existe a  modificação das habitações existentes, possibilitando a fixação dos idosos em suas próprias casas e Design for All, que estabelece parâmetros para as novas construções residenciais, a fim de permitir o uso pela vida toda.
No Canadá, com o nome de Flex Housing, as  residências são construídas para atender a todas as fases do ciclo de vida familiar. Na Inglaterra o termo usado é Lifetime Homes, onde as residências são construídas para acomodar as mudanças que podem ocorrer ao longo da vida do morador. Grey Wave é o termo usado na Itália para os programas habitacionais implantados para garantir a integração social do morador idoso.
Na Holanda , em 1960 foi criado um programa para arrecadar fundos para a construção de vilas para pessoas portadoras de deficiência. Houve críticas por parte da sociedade, pois se chegou a conclusão que isto geraria guetos de desabilitados, porém a verdadeira ideia era tornar essas pessoas socialmente produtivas.
Passou-se assim ao conceito da construção de casas adaptáveis, permitindo o acesso de qualquer pessoa, incluindo aquelas que possuem alguma deficiência física.
Hoje, o Senior Score é uma lista de classificações de ambientes que leva em consideração todas as recomendações referentes a adaptação das casas para a plena utilização dos espaços. A denominação Safe Home é usada para definir requisitos de projeto para garantir a segurança do morador idoso independente.

Majorie M. Naddeo é arquiteta, especializada em desenho universal.
Tel. (11) 9994-0246